quinta-feira, 16 de abril de 2020

ANTONIO MARCOS FALQUETO - NÔTRE DAME E OS MENINOS

NÔTRE DAME E OS       MENINOS.
Antonio marcos falqueto
15 de abril, 2019

Ontem passei por uma experiência triste que por si só já merecia uma reflexão, mas a sequência do hoje aprofundou as questões de forma que não alcanço decerto tudo.
Ia eu pelo metrô em SP às 21:00h em pé, apesar de não estar lotado. Numa parada, de supetão, uma correria e pânico. Sem entender o motivo, fiquei onde estava. Pouco a pouco entendi. Meninos de rua, ou como dizem pivetes, uns dez, entre seis e treze anos, corriam e ocupavam o vagão onde eu estava. Muita gente o abandonou em correria com medo.
Os meninos e as meninas, mal cuidados, sujos, tinham a rua por casa. Mas tinham olhos brilhantes e através destes via-se como eram lindos e lindas. Não tinham fome e estavam alegres, parecia que estavam num passeio de aventura. Um perguntava ao outro, onde iriam. Jabaquara? Este trem vai ao Jabaquara moço? Sim, vai. Fique até a última estação. Não sabiam ler. Parecia que o dia deles era só diversão, mas as marcas nos corpos e nos olhos diziam que não. Aulas, decerto não havia, nem amor de pai e mãe.
"Se fosse de dia a gente ia pra praia" disse um. "Qual praia é melhor?" Perguntou outro. "Ubatuba." "São Vicente." "Maresias." E a menina maior arriscou "Bertioga!" Eu concordei com a cabeça. "O senhor já foi lá?" Não deu tempo de dizer que não, e já estavam todos à minha volta para conversar sobre Bertioga. Eu não perderia aquilo por nada. Vinte pares de olhos vivos queriam saber do mundo, queriam expandir seus horizontes. "Lá tem aquele lugar onde ficam os índios" disse o mais alto. "Como é o nome?" E eu perguntei, "Na aldeia?" "Isso mesmo, disse ele, "Lá é a aldeia."
Então chegou a minha hora de saltar e eu me despedi. Que pena, queria ter essa sensação de liberdade de ir com eles até Jabaquara. Mas no fundo uma grande angústia me entristecia. O futuro desses meninos será horroroso e a morte precoce poderá ser o menor dos males, talvez uma redenção. Antes da morte outros monstros que os privem dessa liberdade podem já estar à espreita, a fome, o crack, a violação do adulto, a prostituição, e as portas fechadas. O futuro lhes será negado e não por escolha deles.
Pois bem, pensativo dormi, acordei e ouvi notícias. Nôtre Dame virou cinzas. O Museu Nacional... Nem dá pra acreditar. Sem a referência do passado como será o nosso futuro? Galhos secos de uma árvore da qual arrancaram as raízes? O que estamos fazendo conosco?
Então me vi como os meninos de ontem. Porquê precipitadamente os julguei sem futuro quando nem posso garantir o meu? Não iam às aulas, mas naqueles olhos vi uma esperança que gostaria de com eles aprender. Talvez eles saibam melhor como sobreviver no mundo caótico que nós letrados estamos criando. Eles não tem noção dos valores que precisamos preservar, pois não receberam educação para isso. E, julgando pelos resultados, temos nós essa noção?
Metrô SP Noticiando: História dos trens do metrô SP
Apropriei-me do texto do meu irmão, por que achei excelente o olhar que lançou sobre um ato da vida que assistiu a céu aberto, pensando na vida como uma peça encenada por todos nós e teve a sensibilidade ou a humanidade de reconhecer nos meninos que entraram no metrô os seus iguais, seres humanos, como todos nós. Adorei o texto e resolvi postá-lo, não que meus blogs sejam muito visitados, mas vai que alguém que precisa ler o lê...

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3 comentários:

  1. É com muito orgulho que me apropriei do teu texto para expô-lo, não tenho um blog de muita badalação, mas sei que quem vem é por que pensa e gosto muiito dessa classe de pessoas e é para elas e por eleas que me dedico sempre que tenho tempo. Obrigado meu irmão por seres como és...

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